Dai-nos ó Pai celeste, pelo Espírito Santo que nos consagrou no santo Batismo, a graça de nos assemelhar cada vez mais em nossas vidas, ao vosso Filho Jesus Cristo! Fazendo em tudo a vossa divina vontade! Dai-nos ardente motivação pela vida de oração e missão! Profundo respeito e disponibilidade aos pastores da Igreja, nosso Papa N. e nosso Bispo N. e a todos os presbíteros, diáconos e coordenadores! Com o vosso misericordioso amor servir todos os irmãos e irmãs necessitados! Concedei amor, sabedoria, paz e unidade aos fundadores, eremitas e amigos do Eremitério! Saúde, paz e prosperidade aos nossos benfeitores! E santas vocações para o carisma do Eremitério e para todas as obras da vossa Igreja! Na proteção de Santa Maria dos Anjos, vossa Mãe e São José, vosso pai adotivo e patrono da Igreja, com toda a nossa vida, possamos amar, louvar, reverenciar e servir, ó Santíssima Trindade! Amém!
EREMITÉRIO SANTA MARIA DOS ANJOS | PRÓLOGO
Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo! Os Fundadores e Eremitas juntamente com os demais filhos e filhas de Deus que se aproximarem da vida e obra do Eremitério Santa Maria dos Anjos, prometam obediência e reverência ao Papa, ao Bispo e a todos os seus sucessores. E reverenciem e respeitem com todo amor e carinho todos os presbíteros, diáconos, religiosos e religiosas e todo o povo de Deus atendendo-os em todas as suas necessidades, visto que pelo batismo são membros vivos do Corpo Místico de Cristo que é a Igreja.
Assim como Santa Maria, Mãe de Deus, disse o “Faça-se em mim” (Lc 1, 38), expressando sua fé e total disponibilidade ao Projeto de Deus, conformando a sua vida à vontade de Deus, os batizados em Cristo, que aceitarem viver esta Regra de Vida do Eremitério Santa Maria dos Anjos busquem o exemplo e coerência de Maria de Nazareth que foi serva consciente e ativa do Senhor, desde seu chamado, no dia da Anunciação e até o fim.
“Fazei tudo o que Ele vos disser!” (Jo 2, 5)
1. O ser humano foi criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1, 26). Esta imagem e semelhança está gravada no mais íntimo e profundo de nós mesmos. Ela não pode ser destruída, pois é dom livre e gratuito do amor do Criador. É dádiva nascida de Deus e não pode ser danificada pelo mal.
2. Porém, por causa da inteligência e liberdade que Deus nos concedeu, nós seres humanos temos em nós uma constante tendência de trocarmos o essencial pelo supérfluo, o espiritual pelo material, o eterno pelo passageiro, o Criador pelas criaturas. O alvo de nossa vida pelo secundário. E essa é a raiz de todo o pecado. Na verdade a palavra pecado, Harmatia no grego ou Hata no hebraico, significa errar o alvo. O alvo de nossa vida é Deus e Deus é amor (1 Jo 4, 8). Desta forma, todas as vezes que nos afastamos do Amor, nos afastamos de Deus e assim estamos no pecado. Afastando-nos do Criador perdemos a noção de nós mesmos e passamos a ser levados pelo orgulho e egoísmo, marcas de nossa natureza mais primitiva. Pelo orgulho e egoísmo nos afastamos de Deus e assim queremos assumir nas dimensões de nossa vida o seu lugar.
3. A proibição a Adão (Gn 2, 17) refere-se ao comer, isto é, consumir. Comer é assimilar, identificar-se com o que se come. É situar-se na não distância, na não diferença entre Criador e criatura. A proibição refere-se à relação entre o ser humano e Deus. O ser humano, através de Adão, é lembrado das condições de ser criatura: ele foi criado, não é Deus; foi criado na carne e habitado pelo Espírito Santo, mas não é Deus, nem jamais será.
4. Há uma auto-suficiência, vindas do orgulho e egoísmo, presente em nossa história que nos faz esquecermos de Deus, afastarmo-nos de Deus e colocarmo-nos no centro da vida, no lugar da fonte original. Mas nós, criaturas, sem o criador, sem tê-lo como centro e razão de nossas vidas, dissolvemo-nos, perdemo-nos, tornamos nossa vida inválida e sem sentido. E assim perdemos a graça.
5. A partir da quebra da relação original com Deus, Adão e Eva, ou seja, a humanidade não habita mais no paraíso. Perder o Jardim de Éden é perder o estado de graça, natural dos filhos e filhas de Deus. Mas Deus, Pai misericordioso e compassivo, não nos deixa assim. Vê que a história de Adão e Eva acontece todos os dias em seus filhos e filhas espalhados pelo mundo inteiro. E começa a restaurar o caminho que possa nos levar até Ele, definitivamente.
6. Após o ser humano ter surgido sobre a terra e estar com a capacidade de se organizar em civilizações, Deus começa a preparar um Povo, que seja depois um sinal para todos os povos da terra: O Povo da Aliança. Deus então escolhe um homem de onde possa ser gerado todo esse povo. Mas a escolha desse homem, já demonstra uma circunstancia que, em toda a história da salvação vai estar presente. Deus escolhe um homem idoso, esposo de uma mulher idosa e que não podia ter filhos: Abraão e sua esposa Sarah. Porque não um homem jovem com uma esposa jovem e fértil? Porque só quem poderia dar um filho, um descendente a Abraão seria Deus. Mas para isso Abraão tinha que estar voltado totalmente para Ele. Ter nEle plena confiança. Essa é a circunstância que sempre estará presente: “É melhor buscar refúgio no Senhor, do que colocar no ser humano a segurança!” (Sl 118, 8), afirmação central de toda a Bíblia.
7. Porém, Abraão, como todo filho de Adão, tenta primeiro ter um filho por sua própria conta e vontade. Com a escrava Agar gera Ismael. Mas Deus não desejava assim. Quando fazemos por nossa conta, nasce de nossas atitudes situações que podem nos escravizar. Nascem filhos de escravos.
8. Deus visita Abraão pessoalmente. E quando Deus visita, a vida humana é fecundada e nasce os frutos da graça. Após a intervenção do Deus do impossível, Abraão gera Isaac. O sonho de Abraão se realiza, ter um filho legítimo e nascido da graça de Deus. Ele e a esposa estéril e anciã tinham gerado uma criança contra todas as possibilidades.
9. Todavia, Adão sempre volta, e Abraão se esquece de Deus. Coloca o filho querido em primeiro lugar. O centro da vida de Abraão torna-se Isaac. Mas Deus sempre vem em nosso auxílio. Deus pede a Abraão uma prova de amor e confiança. E de profundo despojamento. “Abraão, pega teu filho Isaac, a quem tanto amas, e oferece no monte Moriá um grande sacrifício!” (Gn 22, 1 – 18 ). Abraão quer morrer, não sabe porque Deus pede-lhe tamanha prova. Mas sem questionar, leva o menino ao monte e prepara o altar para sacrificar o filho que tanto ama. Isaac ainda pergunta ao pai, “onde está o Cordeiro para o sacrifício?”. E Abraão responde: “O Senhor vai providenciar!”. Mas na bendita hora em que Abraão estende a mão para matar Isaac, o anjo do Senhor o detém: “Abraão, não faz isso com teu filho! Já provaste que temes a Deus! Fica com teu filho!”.
10. Deus nos ama. E por justamente nos amar pede esse sacrifício de nossos Isaacs. Não é porque Deus quer ser o centro e a razão de nossa vida. É porque Ele precisa ser o centro e razão de nossas vidas. Porque tudo o mais, coisas, pessoas e lugares, se vão. Tudo é absolutamente passageiro, mas somente Deus é o eterno. E com Ele somos capazes de suportar todas as perdas da vida.
11. Isaac, filho de Abraão, na vida adulta, une-se a Rebecca e com ela gera Isaú e Jacó. Jacó é quem recebe a benção do pai para ser o líder do clã. E quando adulto une-se a Lia primeiro e depois a Raquel a quem ama verdadeiramente. E com essas duas mulheres e mais suas escravas gera os doze filhos que se transformarão nas doze tribos que formará o Povo da Aliança.
12. Esse povo passa por um período de escravidão no Egito, que representa nossa situação primeira e natural. Somos escravos, dados a escravidão. Novamente por causa de algo para comer. Houve uma grande seca em toda a região de Canaã, menos no Egito, onde José filho mais novo de Jacó estava como administrador, depois de ter sido vendido pelos irmãos por pura inveja por ele ser o preferido do pai Jacó. Providências da vida. Agora com a seca que assolava a região, é justamente lá que os filhos de Jacó vão buscar trigo para comer.
13. Mas, novamente por causa de nossa fome, podemos perder a graça da liberdade, e tornarmo-nos escravos. Após terem mudado todo o clã de Jacó para o Egito e após quatrocentos e trinta anos vivendo no Egito e parte desses como escravos de faraós que desconheciam a história de José. Deus ouve, vê e desce para libertar o seu Povo. Sob a graça e poder de Deus e a guia de Moisés, o Povo inicia o processo de libertação e retomada do caminho para a terra da liberdade. Saem do Egito por meio de sinais e prodígios das mãos do próprio Deus. Deus mesmo caminha com Eles, e o deserto é uma escola, onde está muito presente a fome. A fome que é sempre saciada pelos prodígios de Deus. O único que pode alimentar no deserto da vida.
14. E neste deserto, no Monte Sinai, o líder Moisés recebe através das tábuas da Lei, a vontade do Senhor e o Povo faz com Deus uma Aliança. Mas mesmo aqui, antes o Povo troca Deus por um bezerro de ouro e comem e bebem ao redor do ídolo. Moisés intervém e a Aliança é consumada através de um sacrifício de sangue. O sangue de um cordeiro imolado é aspergido sobre o Povo após este ter prometido a Deus: “Faremos tudo o que Ele nos disse!” (Ex 24, 7).
15. Entrando na terra da promessa após o período dos juízes, o Povo cai na tentação de eleger um rei humano para guia-lo, assim como faziam as nações pagãs. Deus é trocado por homens. Surgem os profetas para garantir que a palavra de Deus seja seguida. Porém, por esquecer-se de Deus novamente, trocá-lo por um homem, trocar a Deus por um templo, trocar a Deus por preceitos humanos e assim afastar-se do essencial, o Povo é levado a outra escravidão: a Babilônia.
16. Após cinquenta anos Deus liberta novamente o seu Povo. E retornando à Terra Santa reconstroem novamente o Templo, e de novo surgem aqueles que tem acesso ao sagrado e aqueles que são excluídos do sagrado. Situação típica quando se estabelece um templo, um lugar para o culto. Quando se encerra Deus, que não tem habitação que o possa encerrar, num lugar. Mas não elegem mais reis porque começa a vir domínios estrangeiros e o mais duradouro foi o Império Romano. Liberdade de culto, mas não liberdade política. Sempre a marca da escravidão! Por quê? Por que filhos de Adão e Eva. Nossas opções, quase sempre, no levam para longe do Criador. Esquecemos de Deus e só nos lembramos dEle quando experimentamos nossa insuficiência. E só tomamos essa consciência quando Ele está longe.
17. “Adão, onde estás?” (Gn 3, 9), essa pergunta significa que a aliança, a união de Deus com o homem foi rompida. O ser humano saiu da visão de Deus, e longe do olhar de Deus sempre se dá a des-graça. Mas Deus, por seu amor, misericórdia e compaixão, não nos deixa caídos pelo caminho. Não é como nós, que somos capazes de passar ao largo. Ele desce, suja-se com nossa poeira e sangue e nos leva com o seu poder para um lugar seguro. Trata de nós, restaura-nos. Gasta tudo o que for necessário. Deus desce para nos encontrar a beira do caminho da vida, desce no seu Filho. Nasce o Emanuel, o “Deus conosco” (Mt 1, 23) para sempre.
18. Enfim, chegada à plenitude dos tempos, em Isabel, João Batista encerra o tempo de espera da Libertação e se abre um Novo Testamento (Lc 1, 57 – 66). Em Maria e por Maria, Nosso Senhor Jesus Cristo, o Emanuel, passa a ser o caminho de vida e libertação vindo do Pai Criador. Deus Pai vê, ouve e desce (Ex 3, 7 – 12) até a realidade humana no seu Filho Jesus, para trazer ao ser humano a liberdade dos Filhos e Filhas de Deus.
19. Veio ensinar-nos a ver Deus como Pai, como o dono da casa. Aquele que é o Senhor de todos os bens que costumamos gastar com nossa prodigalidade e pecado, mas que está na varanda da casa, constantemente a espera do nosso retorno, para nos acolher sem perguntas, sem cobranças, mas com beijos, abraço e festa (Lc 15, 11 – 32).
20. Pelo Pai, os filhos estariam sempre em sua casa. Mas Deus Pai nos dá total liberdade para descermos no mais profundo dos infernos humanos, se quisermos, porque só assim podemos ver que só somos felizes na presença dEle, na casa dEle. E mais, nos ama tanto que é capaz de sacrificar seu próprio Filho, como um Cordeiro Imolado para a festa de nosso retorno e ainda nos dá seu próprio Filho em alimento, o fruto bendito, para saciar a nossa fome sempre presente. Fome que dificilmente conseguimos identificar como fome de Deus. O ser humano tem fome de Deus, e Deus tem sede da presença humana (Jo 19, 28).
21. A vida cristã tem como princípio e fim a Encarnação do Verbo, o Filho de Deus, que se fez humano. Que foi, que é e sempre será o sacramento do Pai no meio de nós. Sacramento é tudo o que é sinal de Deus e ao mesmo tempo presença real de Deus. Cristo é sinal do Pai e ao mesmo tempo é a presença do Pai. E também sacramento significa “ação de consagração com um juramento e um compromisso” (Neunheuser).
22. Com o seu sacrifício na Cruz, Jesus Cristo abre para a festa da salvação que tem como lugar privilegiado a Igreja que Ele funda através dos Apóstolos. A Igreja passa a ser o sacramento do Cristo no mundo, ou seja, sinal e presença real do Filho de Deus através do seu corpo místico formado por todos os batizados de todos os tempos. “Fomos todos batizados num só Espírito para sermos um só corpo” (1Cor 12,13).
23. Igreja que nasce do lado aberto do Crucificado, assim como Eva saiu do lado aberto de Adão gera, alimenta, fortalece e envia para a missão com os seus sete sacramentos os novos filhos e filhas de Deus em Cristo Jesus.
24. O santo Batismo, o primeiro sacramento, é o fundamento de toda a vida cristã, a porta da vida no Espírito (“vitae spiritualis janua”) e a porta que abre o acesso aos demais sacramentos. Pelo Batismo somos libertados do pecado e regenerados como filhos e filhas de Deus, tornamo-nos membros de Cristo. Somos incorporados à Igreja e feitos participantes de sua missão.
25. O Batismo é o sacramento da regeneração pela água na Palavra. Ele é denominado Batismo com base no rito central pelo qual é realizado: batizar (“baptizem”, em grego significa “mergulhar”, “imergir”); o “mergulho” na água simboliza o sepultamento da criatura humana na morte de Cristo, da qual com Ele ressuscita como “filho (a) de Deus” (2Cor 5,17; Gl 6,15).
26. Todas as prefigurações da antiga aliança encontram sua realização em Cristo Jesus. Ele começa sua vida pública depois de ter-se feito batizar por São João Batista no Jordão, e após sua ressurreição confere esta missão aos apóstolos: “Ide, pois, fazei que todos os povos se tornem meus discípulos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei” (Mt 28,19-20). Foi em sua Páscoa, ou seja, o oferecimento na Cruz, que Cristo abriu a todos os homens as fontes do Batismo. Com efeito, já tinha falado da paixão que iria sofrer em Jerusalém como de um “batismo” com o qual devia ser batizado.
27. Donde nos vem o Batismo, se não da cruz de Cristo, da morte de Cristo. Lá está todo o mistério: ele sofreu por nós. Sacrificou-se por nós. Deus não nos pede mais provas de amor. Ele nos dá a maior de todas, não poupa o seu Filho como poupou Isaac, mostra que seu amor por nós é a razão de toda a sua existência. É um Deus para nós, um Deus conosco. Que quer apenas a comunhão com a nossa vida. Tornar-nos seus filhos e filhas, não deuses, nem escravos, mas filhos, co-herdeiros em Cristo de sua graça e eternidade.
28. É somente em Jesus Cristo que assumimos uma nova história, uma nova posição e atitude diante do mundo, somos agora redimidos, não temos mais dívidas advindas de nosso pecado. O pecado não tem mais força sobre nós, em Cristo Jesus podemos vencer todas as ciladas do tentador e não mais nos deixarmos seduzir pelos frutos da árvore, mas estarmos constantemente ao lado da Trindade. Amados pelo Pai, redimidos pelo Filho e regenerados pelo Espírito. No Filho de Deus agimos, movemo-nos e somos (At 17, 28 – 29). É somente nEle que somos salvos e, por nossa vez, tornamo-nos salvadores.
29. É o Batismo a fonte dessa vida nova em Cristo, fonte esta da qual brota toda a vida cristã. O selo batismal capacita e compromete os cristãos a servirem a Deus em uma participação viva na sagrada liturgia da Igreja e a exercerem seu sacerdócio batismal pelo testemunho de uma vida santa e de uma caridade eficaz. Feito membro da Igreja, o batizado não pertence mais a si mesmo, mas àquele que morreu e ressuscitou por nós. Logo, é chamado a submeter-se aos outros, a servi-los na comunhão da Igreja, a ser “obediente e dócil” aos chefes da Igreja e a considerá-los com respeito e afeição.
30. Assim como o Batismo é a fonte de responsabilidades e de deveres, o batizado também goza de direitos dentro da Igreja: de receber os sacramentos, de ser alimentado com a Palavra de Deus e de ser sustentado pelos outros auxílios espirituais da Igreja. Assim como um filho deve ser cuidado pela sua mãe.
31. O Batismo é o sacramento que nos configura a Jesus Cristo. É um convite a agirmos e, ao mesmo tempo pelo Espírito, dá-nos a força e a capacidade, se quisermos, de “termos os mesmos sentimentos de Cristo” (Fl 2, 5).
32. Jesus Cristo deve ser o centro de nossa vida, porque Ele foi e é o Filho de Deus perfeito que teve a capacidade perfeita de ter sua vinda inteira voltada ao Pai, fonte e origem de tudo. Aqui está o Mistério da vida! O segredo da vida! A busca incansável para estarmos voltados plenamente ao Pai.
33. E Jesus Cristo é o caminho que vem do Pai e revela o seu rosto: “quem me vê, Filipe, vê o Pai!” (Jo 14, 6 – 14). Em Nosso Senhor Jesus Cristo, em sua vida, palavras e ações, a pessoa cristã tem o caminho pleno para chegar ao Pai.
34. Os primeiros cristãos denominavam-se seguidores do “Caminho”. “Caminho” era a palavra muito usada para designar o movimento suscitado pelas andanças de Nosso Senhor. Não era uma simples caminhada, percorrendo vias e ruelas, subindo e descendo pelas terras da Galiléia e da Judeia. Mas, era uma grande travessia: Jesus veio nos tirar do lugar situacional de opressão e de “não vida”, longe de Deus Pai, ocasião surgida com nosso pecado, para um estado de vida plena e abundante (Jo 10, 10), na Casa do Pai.
35. Tirar-nos da situação de escravos para a situação de homens e mulheres livres pela graça. Da opressão de uma lei que limita e não considera o ser humano para tornamo-nos regidos pela Lei mais eficaz e que torna todas as realidades humanas felizes, a Lei do Amor. Veio conduzir de volta ao Pai, o “não povo” do deserto, tornando-se definitivamente Povo de Deus, formados por filhos e filhas de Deus em Cristo Jesus.
36. O Evangelho diz que o Pai entregou tudo a Jesus (Jo 6, 37) e que é por meio dEle que o Pai atrai a si todas as pessoas (Jo 6, 44). É por isso que Nosso Senhor Jesus se define como caminho de vida, o caminho para o Pai. O cristão que se identifica e assume a missão como Jesus, chega ao Pai. Muitos discípulos desistem do caminho do seguimento. Nosso Senhor Jesus desafia os Doze e lhes pergunta se também desejam ir embora. Simão Pedro responde pelo grupo: “A quem iremos, Senhor? Só Tu tens palavras de vida eterna. Agora nós acreditamos e sabemos que tu és o Santo de Deus” (Jo 6, 60 – 69). A resposta de Pedro é a resposta dos que, em todos os tempos e lugares, compreendem que não há outro caminho a não ser Nosso Senhor Jesus Cristo e por isso se põe a caminho de viver a prática de sua vida. Unem-se a Ele e buscam fazer o que Ele fez. Abraçam a fé e o compromisso, a adesão e o seguimento.
37. O filho e a filha de Deus, ou seja, o Batizado em Cristo Jesus, com humildade e coragem, modela sua vida em concordância com a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo. E a vida de Jesus era ver o que o Pai fazia e fazer plenamente a sua vontade (Jo 5, 19). Fazer a vontade do Pai é deixar-se conformar com a imagem do Pai, sendo como o Filho, pela ação do Espírito Santo. Fazer a vontade do Pai é o caminho de vida, escolhido por Jesus. Esse é o caminho para quem deseja segui-lo. É o caminho que gera a alegria de pertencer e de construir o Reino.
38. O modo de vida dos filhos e filhas de Deus do Eremitério Santa Maria dos Anjos, deve ser o de buscar ao máximo em suas vidas assemelharem-se ao Filho de Deus em toda a sua maneira de ser. E não serão consagrados à Obra ou à comunidade do eremitério, visto que já são consagrados a Deus e à Igreja pelo Santo Batismo. Batismo que nos fez pela graça, Cristãos, ou seja, novos “cristos” no mundo. Nosso Senhor Jesus revela a sua identidade de Filho e como deve ser quem deseja segui-lo como discípulo. E ser discípulo de Nosso Senhor é exercitar-se no itinerário a seguir:
39. O Filho de Deus quando nasceu “foi envolvido em panos e deitado num coxo, numa manjedoura, porque não havia lugar na hospedaria” (Lc 2, 7). E ao longo de sua vida pública dormia em qualquer lugar, procurava os jardins e montanhas, “pois não tinha onde recostar a cabeça” (Lc 9, 58). Assim, os filhos e filhas de Deus deverão primar por uma vida simples e austera. Não ser exigente no comer, onde dormir. Em todas as situações da vida procurar o mais simples.
40. Em relação a objetos, lugares e pessoas ter sempre a consciência de que nada e nem ninguém é nosso. Tudo é de Deus que nos permite ao longo da vida, que coisas, lugares e pessoas estejam conosco, mas sem ser de nossa propriedade.
41. Dessa forma, buscar viver com poucos pertences pessoais, buscando em tudo o essencial. Ter como bem primeiro e fundamental, Deus e buscar estar sempre na Presença dEle. E para não cair na tentação da preocupação com o que vestir, com modas e modismos, e combinação de roupas, os membros do eremitério deverão vestir roupas brancas que serão ainda sinal visível da consagração batismal. Prefigurando a multidão a chegar ao céu, vestida de branco, vindo da grande tribulação do mundo e que “Lavaram suas vestes no sangue do Cordeiro” (Ap 7, 14). E para as celebrações litúrgicas todos podem usar cogulas que é a veste monástica daqueles que saem do mundo para se entregarem totalmente a Deus.
42. Esta é a característica mais importante dos filhos e filhas de Deus e que sustenta todas as demais. É o que marca toda a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo no meio de nós. Ele veio e tudo fez por causa do Pai. Pelo seu amor infinito pelo Pai. Jesus busca Deus Pai, desde quando tem consciência de sua existência. “Porque me procuravam? Não sabiam que eu deveria estar na Casa de meu Pai?” (Lc 2, 49). E no primeiro momento decisivo de sua vida, quando se prepara para iniciar sua vida pública e é tentado no deserto. Vive as três tentações que afligem os filhos e as filhas de Deus: o prazer, o ter e o poder.
43. Eis a nossa contínua tentação: trocar o Pai, substituir o Pai pelos prazeres do corpo, pelas coisas que podemos possuir e por posições e funções que podemos desempenhar. Diante de cada investida de Satanás, Nosso Senhor respondia com a Palavra de Deus, colocando o Pai como razão primeira e final de tudo. Para a tentação do prazer: “Nem só de pão vive o homem, mas de toda Palavra que sai da boca de Deus!” (Mt 4, 4); para a tentação do ter: “Ao Senhor teu Deus adorarás e só a Ele servirás!” (Lc ); e para o poder: “Não tentarás o Senhor teu Deus!” (Lc ). O poder pertence somente a Ele.
44. Durante toda a vida de Nosso Senhor Ele coloca o Pai em primeiro lugar. Sabe que é o Pai a fonte de todo o bem. Por isso que os filhos e filhas de Deus devem ter Deus em vista em todos os momentos, e sempre optar por Ele. Lidar com as coisas, pessoas e lugares como se não os tivesse, mas tendo a consciência de que estão consigo, mas que um dia podem não mais estar. Exercitar-se na consciência de que “DEUS É O MEU TUDO”, para ter sempre o coração tranquilo. Tudo o mais que possamos ter é acréscimo, o mais valioso já temos: DEUS. E a Ele ninguém jamais perde. Sempre estará conosco! Vigiemos sempre por que está escrito que “tendo terminado toda espécie de tentação, o diabo se afastou dEle até o momento oportuno”. A qualquer momento pode chegar o momento oportuno.
45. A Igreja tem como precioso exercício espiritual desde seus primórdios a prática do jejum. Principalmente o mais simbólico, no essencial, pão e água. Se conseguimos controlar o estômago, nosso ser mais animal, o instinto mais básico de preservação da vida, podemos começar a controlar e integrar todas as nossas demais carências e necessidades que podem nos afastar de Deus. Dessa forma, nas sextas-feiras do Tempo comum, Quaresma e Advento, das seis da manhã às seis da tarde os filhos e filhas de Deus, que estiverem com boa saúde, busquem fazer jejum a pão e água pela restauração espiritual de todas as criaturas em Deus. E para exercitar-se no mais precioso, a Presença de Deus. E negar a si mesmo, através do estômago.
46. Quanto aos demais dias da semana, buscando uma alimentação saudável que faça bem ao espírito e ao corpo, que se sirva frutas, sucos e amêndoas pela manhã, saladas de verduras e legumes em geral, ovos, proteína de soja e alimentos integrais, com sobremesas ao meio-dia e sopas, pães, queijos, doces, leite e café no final do dia. Tudo o mais natural possível com respeito à vida dos animais de qualquer espécie. E por mais delicioso que seja o que é oferecido, buscar comer sempre o suficiente, sem repetir. Que as refeições sejam sempre realizadas em silêncio que é a atitude permanente de escuta que o discípulo deve ter. A não ser que seja um dia festivo ou encerramento de retiros e formações. Mas que se busque sempre o exercício salutar para o espírito, o silêncio.
47. “Originou-se entre eles uma discussão sobre quem deveria ser considerado o maior. Jesus lhes disse: ‘Os reis das nações as dominam e os que exercem autoridade são considerados benfeitores. Não seja assim entre vos, mas o maior seja como o menor, e quem manda, como quem serve. Pois quem será o maior, quem está sentado à mesa ou quem serve? Não é quem está sentado à mesa? Pois estou em vosso meio como quem serve” (Lc 22, 24 – 27). O (a) filho (a) de Deus, deve exercitar-se sempre no caminho da humildade e do serviço diante de todos.
48. Nunca se achar superior a alguém. Mas estar sempre pronto para servir. Ser capaz de sentar no chão, deitar no chão. Ser esquecido sem se revoltar. Ficar feliz quando valorizam os outros e não a si. Ficar feliz quando não é reconhecido no bem que faz. Por que é seguidor de Jesus Cristo que mesmo sendo Deus, desde o seu nascimento seguiu por um caminho de descida e humilhação. No início de sua vida pública foi batizado por um ser humano, como se fosse mais um pecador necessitado de conversão, a se apresentar a João Batista.
49. E no final de tudo, lavou os pés de seus amigos, foi preso sumariamente e aceitou ser julgado por um ser humano, como um criminoso qualquer. “Tende em vós os mesmos sentimentos que Cristo Jesus teve: Ele, subsistindo na condição de Deus, não pretendeu reter para si ser igual a Deus. Mas aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo, tornando-se solidário com os homens. E, apresentando-se como simples homem, humilhou-se, feito obediente até a morte, até a morte da cruz” (Fl 2, 5 – 8). Ser humilde e sempre pronto a servir é característico das obras e ações do cristão que brotam do amor de Deus.
50. O Nosso Deus é um Deus pessoal, por isso relacional e compassivo. Ele é amor. Por isso não suporta ver qualquer criatura em sofrimento. Quando se revela pela primeira vez para Moisés, e diz o seu nome, fala também porque não mais vai ficar somente no céu e na eternidade. Não pode ser um Deus distante. É fora de sua natureza isso. Comunica a Moisés porque estava ali e porque não mais deixou de caminhar conosco. “Eu vi a opressão de meu povo no Egito, ouvi os gritos de aflição diante dos opressores e tomei conhecimento de seus sofrimentos. Desci para libertá-los” (Ex 3, 7 – 8).
51. Nosso Senhor Jesus Cristo que vem revelar a face do Pai, vem encarnar humanamente essa opção. “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para anunciar aos aprisionados a libertação, aos cegos a recuperação da vista, para por em liberdade os oprimidos, e para anunciar um ano de graça do Senhor” (Lc 4, 18 – 19).
52. Por isso o (a) filho (a) de Deus deve ter o olhar compassivo a todos os que sofrem por situações humanas desfavoráveis. Indo até eles, acolhendo sem nenhum julgamento e no amor oferecer todas as condições que possam deixa-los em condições dignas de um ser humano, filho de Deus. Dessa forma, que o Eremitério crie e mantenha permanentemente através de um serviço de ponte entre aqueles que tem recursos materiais e aqueles que não tem, projetos que possam atender as necessidades dos mais empobrecidos, em qualquer idade, transformando as realidades de opressão.
53. E no tempo da Quaresma e Advento os filhos (as) de Deus que desejarem, poderão realizar a experiência anual de Abandono, de sete dias, em qualquer lugar do Brasil ou do mundo em que se possa comungar de alguma realidade de vida onde o ser humano vive a dimensão de precariedade de sua existência, como mendigos de rua, favelas, orfanatos, ancionatos, hospitais, clínicas de recuperação de viciados, caminhadas de abandono.
54. Está sempre ecoando as palavras do Pai ao irmão mais velho: “Filho, tu está sempre comigo e todos os meus bens são teus. Mas era preciso fazer festa e alegrar-se porque este teu irmão estava morto e voltou à vida, tinha-se perdido e foi encontrado” (Lc 15, 31 – 32). Se não for nós os Filhos de Deus a ir em busca e ajudar… Quem será?… Se não for agora?… Quando? “O Filho do homem veio procurar e salvar o que estava perdido” (Lc 19, 10).
55. Acompanhar Nosso Senhor Jesus Cristo no caminho da solidão no Getsêmani. A pessoa de fé vive o compromisso com a paixão de Nosso Senhor presente nas realidades atuais. Sempre é Sexta-feira Santa, quando acontece a destruição, a violência, a rejeição, os sofrimentos, as injustiças e o desamor. Por meio destas situações de morte, as pessoas continuam a vivenciar, hoje, a morte de Jesus.
56. O Salvador é pobre e se comunica com seu povo como pobre: “vocês encontrarão um recém-nascido, envolto em faixas e deitado numa manjedoura” (Lc 2, 12). E ao mesmo tempo, não podemos esquecer jamais de sua afirmação inquietante: “Foi a mim que o fizeste” (Mt 25, 32 – 45).
57. A pessoa de fé adota a pedagogia de Jesus, expressa no Pai Nosso. Volta-se, em primeiro lugar, para o Nome do Pai, seu Reino e fazer sua vontade. Essa oração predispõe ao louvor e à solidariedade. A oração configura e transforma o caminho do ser humano e o conforma com a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo. A experiência de Nosso Senhor Jesus no Monte das Oliveiras revela a importância da oração em tempos de provação. Jesus reza no deserto, no Monte das Oliveiras, no alto da montanha, no Templo, no alto da Cruz. Ele reza antes do amanhecer e passa a noite em oração. Reza de diferentes modos: em alta voz, pede a benção do Pai na partilha dos pães e na vivificação de Lázaro; em silêncio, ao escolher os discípulos e ao agradecer ao Pai, pelas maravilhas operadas na primeira missão apostólica. Enfim, reza na alegria e na tristeza, à véspera da morte. A oração é um valor central na vida e no caminho de Jesus. Ele estabelece momentos e lugares para estar a sós com o Pai, pois é vital o diálogo e intimidade com Ele.
58. “Vós bem sabeis: se o dono da casa soubesse a hora em que viria o ladrão, vigiaria e não deixaria arrombar lhe a casa.” (Lc 12, 39). Como disse o Pe. Miguel Shoereder (SCJ) em uma pregação, “Jesus tinha dois tempos em sua vida, no primeiro tempo estava com o povo, ensinando, curando, convivendo, amando… e o segundo tempo era, no início da manhã ou no final da tarde, ou ainda a noite inteira, retirava-se sozinho para estar com o Pai. “Ao amanhecer, retirou-se e saiu para um lugar afastado” (Lc 4, 42). Mas para quê? Para olhar para o Pai. Ouvir o Pai. Amar o Pai. Ele não precisava disso, porque era o Filho de Deus, mas aqui está todo o segredo de sua existência, Ele era o enviado do Pai, por isso a plena busca e sintonia com aquEle que é a fonte de tudo”. Ele se retira do grupo para estar a sós como Pai. Para rezar. Na vida de Nosso Senhor transparece de maneira clara o sentido da oração.
59. As duas dimensões essenciais da vida com Deus: a oração e a ação. O Filho de Deus não age sem conversar antes com o Pai. Ele tem todo o poder, mas tudo faz em sintonia com o Pai. Sua vida é uma contínua oração. Para o Filho de Deus, o Pai é o amigo íntimo. AquEle que se mostra para Ele. Que não tem horário, a qualquer momento pode chegar, falar, mostrar-se. O Filho de Deus está sempre atento ao Pai. Está sempre em sua presença. E também a oração do Filho de Deus pode implicar em uma ação de atender ao Pai, mesmo nos pedidos e inspirações que são contra a sua vontade pessoal. “Pai, se queres, afasta de mim este cálice; contudo não se faça minha vontade, mas a tua” (Lc 22, 42).
60. Para estar em conformidade com o Projeto do Pai, a exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo que mesmo sendo Ele a própria Palavra encarnada, cresceu indo à Sinagoga para escutar a Palavra. Aprendeu com seus pais que também escutavam a Palavra. Escutava-a em seu coração e uma vez compreendida, assimilada, transformava-a em obras de amor e de fraternidade. Assim todos os filhos (as) de Deus levem uma vida de oração tendo como fonte a Palavra.
61. Exercitem-se ao longo do dia nas três orações pessoais que os místicos nos deixaram e que são marcas dos cristãos católicos: a primeira é a oração do Rosário. Os filhos e filhas de Deus como autênticos filhos de Deus em Cristo Jesus e filhos da Igreja que tem como pré-figuração a grande Mãe de Deus, Maria Santíssima que sempre nos convida à oração de Rosário, deverão meditar ao longo do dia os Mistérios do Senhor através da oração do Rosário. Que possui a poderosa graça da intercessão, mistério que não conseguimos sondar, mas nenhum pedido ou prece fica em vão quando é apresentado com fé e confiança antes da meditação de cada terço ou mistério, feliz daquele ou daquela que descobriu em sua vida a graça da oração do rosário. E também é marca do cristão a responsabilidade de com amor rezar e interceder por seus irmãos e irmãs principalmente aqueles que são perseguidores e que nos exigem mais a arte de amar. “Simão, Simão, Satanás vos procurou para vos peneirar como trigo, mas eu roguei por ti, para tua fé não desfalecer; e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos” (Lc 22, 31 – 32). A segunda oração pessoal é a Leitura Orante da Palavra que alimenta a mente e o coração, tornando o leitor orante em um conhecedor profundo e íntimo da Palavra de Deus; e a Adoração silenciosa ao Santíssimo, oração mais perfeita, a contemplativa, onde o (a) filho (a) de Deus silencia diante do Mistério de Deus, sem mais pronunciar palavras, sem mais pedir ou agradecer, sem mais nada fazer, sem mais ler a Palavra porque está diante dela mesma, consagrada na Hóstia Santa. A oração contemplativa de somente estar diante do Divino Oleiro e se deixar docemente modelar por Ele dia-a-dia. Que essa oração da Adoração seja vivida em comunidade todas as quintas-feiras, dia da Eucaristia, desde o amanhecer até a Missa do Por do Sol, e que a cada hora estejam membros da fraternidade ou retirantes, diante do Senhor.
62. Além das três orações pessoais propostas para o longo do dia, que também os (as) filhos (as) de Deus tenham a Liturgia das Horas para rezarem pessoal e comunitariamente os salmos e leituras em sintonia com toda a Igreja de Cristo, Corpo Místico de Cristo que reza ao Pai e ao mesmo tempo Esposa que conversa com seu Esposo através da oração.
63. O período da manhã seja no eremitério ou para quem quiser levar essa vida, de oração pessoal e estudo. E por volta do meio-dia que todos possam se encontrar como assembleia orante, na Capela Principal, para que em dois coros celebrem a Hora Média, hora da Crucifixão do Senhor.
64. Que os trabalhos sejam realizados na parte da tarde e, ao anoitecer, que possam todos se reunir novamente na Capela para, de segunda a quinta-feira, celebrarem o Ofício das Vésperas, seguido da Celebração Eucarística que é a memória da Vida, Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor. Jesus celebra a Páscoa dos judeus e, nela, institui a nova Páscoa e determina que a celebrem em sua memória. Jesus toma e parte o pão, pronuncia a benção de ação de graças; também toma o vinho, agradece ao Pai e distribui entre os comensais. Partir o pão, abençoar, dar graças ao Pai são gestos de sentido transcendente que apontam para a entrega definitiva. Não faz de seu corpo e sangue alimento para si mesmo, mas os entrega como alimento e sustento dos discípulos e discípulas.
65. Na Santa Eucaristia celebramos a Páscoa de Jesus, mas celebramos, também, a páscoa e a vida de cada cristão. Pela escuta da Palavra de Deus e pelo alimento do Corpo e Sangue de Jesus, a fé cristã é fortalecida, para continuar, com mais ardor, a missão de Nosso Senhor Jesus. Quem recebe o Pão consagrado e o assimila, descobre que Deus lhe confia a tarefa de tornar-se pão partilhado para a vida de todos. Quem recebe Nosso Senhor Jesus como pão não pode fugir da responsabilidade de ser pão para a vida dos outros. Na partilha do Pão (Corpo) e do Vinho (Sangue) realiza-se o pedido de Jesus ao Pai: “que eles sejam um, assim como nós somos um” (Jo 17, 11).
66. Na sexta feira, dia do sacrifício da Cruz do Senhor, após o jantar, que se celebre a Oração da Cruz, com velas acesas e mantras. Trazendo para a cruz de Cristo as cruzes pessoais de cada um e dos sofredores do mundo. Para que Ele, e somente Ele transforme os pedidos e preces que trouxermos em Vida e Ressurreição.
67. No sábado à noite, após o jantar que a comunidade celebre a Oração da Ressurreição, com o Círio Pascal como centro. Também com velas e mantras. Dando a treva inicial lugar para a Luz que emana do Ressuscitado que transforma cada fiel seguidor de Cristo em Luz para o mundo nos mais variados lugares por onde passa a vida humana.
68. E aos domingos, dia do Senhor, que a fraternidade do Eremitério convide e celebre com todos os filhos e filhas de Deus que residem ao redor, por volta da nove da manhã, hora de Pentecostes, a Santa Missa em ação de graças por todo bem que vem de Deus. “Vigiai sempre e orai para escapardes a tudo que há de vir e comparecerdes diante do Filho do homem” (Lc 21, 36).
69. A verdade é a perfeita sintonia entre a Palavra e a realidade. Entre o que se pensa e o que se faz. A verdade perfeita é Deus, em quem não há sombras, máscaras, fingimento, mentiras. E Ele nos concedeu um caminho para a sua verdade, para exercitarmo-nos em sua verdade, a sua Palavra, que antes de encarnar-se foi escrita pelos sábios amigos de Deus na Torá, Primeiro Testamento e depois escrita nas narrativas de sua passagem pela terra como ser humano, Jesus Cristo, o Novo Testamento. No Filho de Deus, que é a verdade, podemos basear a nossa vida. Ele é sincero de coração. O que pensa e sente exterioriza, não esconde-se, não finge, não usa máscaras. E assim deve ser o filho e a filha de Deus. Não falar de ninguém que não esteja em sua presença, grande tentação que quase sempre se apresenta e feliz de quem a vence a cada dia. De outro modo ser capaz de falar tudo para o seu irmão quando necessita ser falado. “Ora, vós fariseus limpais a taça e o prato por fora, mas o vosso interior está cheio de roubo e maldade! Insensatos! Por acaso quem fez o exterior não fez o interior?” (Lc 11, 39 – 40). Com amor e caridade, justiça e honestidade. A verdade de Deus se manifesta totalmente em Cristo. E o cristão é aquele que anda na verdade de Cristo. “Pois não há nada oculto que não se venha a descobrir e nada escondido que não se chegue a saber. Por isso, tudo o que dizeis nas trevas, será ouvido na luz; e o que falais aos ouvidos nos aposentos, será apregoado de cima dos telhados.” (Lc 12, 2 – 3).
70. A verdade e a fidelidade caminham juntas. Deus é fiel (2 Tes 3, 3). Deus realizou conosco uma Aliança de nos proteger e guardar eternamente, como filhos e filhas seus. Deus tinha dado sua palavra, Ele iria cumprir… Nunca irá nos deixar, por isso Deus é para sempre fiel. Essa é sua natureza. O filho e filha de Deus em Cristo Jesus deve ser é fiel e verdadeiro. Deus quer que sejamos parecidos com Ele… Ele cumpre o que promete. Ele vai até o fim. Nós precisamos também honrar o que prometemos. Pensar bem, antes de dar a palavra, antes de estabelecer compromissos. Serei capaz de cumprí-lo? E uma vez consciente e firmada nossa palavra devemos ir até o fim. Sem atalhos, sem dualidades, sem ambivalências. A felicidade passa pela fidelidade. Só é feliz realmente quem é fiel. “Pela paciência salvareis vossas vidas” (Lc 21, 19).
71. “Num dia de sábado, andando por entre as plantações, os discípulos arrancavam espigas e, esfregando nas mãos, as comiam. Alguns fariseus diziam: ‘Como fazeis o que não é permitido fazer em dia de sábado?’ Jesus respondeu-lhes: ‘Não lestes o que fez Davi, quando teve fome, ele e os companheiros? Como entrou na casa de Deus e, tomando os pães sagrados, comeu e deu aos que vinham com ele, quando só é permitido comê-los aos sacerdotes?’ E lhes dizia: ‘O Filho do homem é senhor também do sábado” (Lc 6, 1 – 5). Nosso Senhor vem deslocar o sagrado do templo de pedra para o ser humano. O ser humano é sagrado para Deus. Todas as ações de Deus tem como destinatário o ser humano, o preferido de Deus.
72. Por isso, para o Filho de Deus não há lei, nem normas religiosas ou civis que sejam maiores que a necessidade humana. O mais importante é atender o ser humano em sua necessidade mais urgente e verdadeira. E tem essa liberdade por que pertence a Deus e só a Ele somente. Em outro momento, “Mestre, sabemos que falas e ensinas com retidão e sem medo de ninguém mostras o caminho de Deus segundo a verdade. É lícito pagar tributo a César ou não?’ Vendo-lhes a falsidade, respondeu Jesus: ‘Mostrai-me a moeda do imposto. De quem é a imagem e inscrição?’ Responderam eles: ‘De César’. Então lhes disse: ‘Pois dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Lc 20, 20). Jesus age de acordo com o que sente interiormente. A moeda tem a imagem de César, deve voltar a César. O ser humano é a imagem de Deus, deve ser de Deus.
73. O filho e a filha de Deus repousam em Deus somente. Escutam Deus continuamente, por isso seguem suas inspirações. Mesmo que corram o risco de cometer erros. Mas esses, se a pessoa está em Deus, serão sempre meios de aprendizado e amadurecimento. Se vivemos firmemente apoiados em Deus e tudo é bom. Os filhos e filhas de Deus devem viver sempre a partir da dimensão de Deus para poderem ser livres verdadeiramente. Devem buscar estar sintonizados com Deus em todos os momentos, almejando em tudo fazer sua vontade. Essa é a garantia e o caminho mais perfeito para vivenciarem a liberdade dos filhos de Deus em Cristo Jesus. Desta forma, que no eremitério não haja superiores, nem grupos definidores determinando o que as pessoas irão fazer ou deixar de fazer. A fraternidade fonte, formada pelos dez membros iniciais, ou fundadora de novos eremitérios, seja uma fraternidade para assegurar que a espiritualidade e a mística do eremitério, assim como suas atividades estejam sempre no caminho do evangelho e proporcionando a liberdade dos filhos e filhas de Deus. Mas que não se arvore nunca a determinar a vida das pessoas, suas escolhas e seus caminhos. Isso que cada um busque o seu, no silencio, na oração, nos estudos e na intimidade com o Senhor que é o nosso único guia e mestre e o inspirador das opções e escolhas que cada um irá fazer na vida. Da mesma forma, que todos os irmãos e irmãs estejam sempre prontos para ouvir e aconselhar a quem precisar, porém que as decisões de vida sejam tomadas pelo fórum interno de cada um.
74. Uma das escravizações e condicionamentos do mundo é a questão do tempo. Tudo é demarcado pelo tempo. Não se vive, não se sente as pessoas, acontecimentos e lugares porque há uma pressa de se chegar, de se terminar, mas para quê? Chegar onde se o ponto final não existe, temos a eternidade pela frente. Quantas coisas e momentos importantes não vivemos e nem tomamos consciência deles porque estamos com pressa, escravizados pelo tempo. Dessa forma, no Eremitério que se viva a experiência da liberdade da escravidão da hora. Que não se tenha a preocupação da marcação exata do tempo. O sol e a luz do dia serão os orientadores das orações, celebrações, atividades e refeições. Quando o almoço, principal refeição do dia estiver pronto, que se chame a todos com o sino para a oração da Sexta. Que horas? Segundo o sol, por volta do meio-dia. Quando o sol se pôr será a hora das Vésperas e celebração Eucarística e após ela, o jantar… Que horas os atendimentos? No início da manhã, perto do almoço, após o almoço… Que horas a celebração das Vésperas? Quando o sol se puser.
75. “Por aqueles dias Jesus retirou-se para a montanha a fim de rezar e passou toda a noite em oração a Deus. Pela manhã chamou os discípulos e escolheu doze dentre eles, que chamou de apóstolos” (Lc 6, 12 – 13). O filho e filha de Deus, a exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo, opta sempre pela vida em comunidade. Mesmo que seja difícil a convivência por causa das diferenças no pensar, agir e ser de cada um. Que linda criatividade a de Deus, nada e ninguém é igual. As diferenças nos desestabilizam e por isso nos ajudam a mudar e a crescer. É aqui que se exercita o amor. A comunidade deve sempre ser alicerçada no amor. No querer bem ao outro, como ele se nos apresenta. Do jeito que Deus o fez para nós.
76. A prática do diálogo e da transparência é fundamental. Desta forma, se alguém tiver algo que não está resolvido com o irmão ou irmã, que reze buscando auxílio e sabedoria no Senhor e intercessão da Virgem Mãe de Deus e depois procure o irmão ou a irmã a sós e exponha, buscando ter serenidade o que aflige o seu coração na relação de ambos. E que todos tenham a atitude do acolhimento uns para com os outros quando os acertos acontecerem, querendo sempre que as relações sejam reconstruídas e fortalecidas no amor, compreensão, conhecimento e aceitação uns pelos outros. Pois a comunidade se alicerça no amor, na oração pessoal e em comum e no perdão mútuo. O convite insistente de Nosso Senhor Jesus, para quem deseja segui-lo, é de assumir o novo caminho, a nova proposta do Evangelho, ou seja, o novo mandamento. Amar, incondicionalmente, um ao outro como Nosso Senhor Jesus prova que ama. “Se vocês tiverem amor uns para com os outros, todos reconhecerão que vocês são meus discípulos” (Jo 13, 35).
77. O Eremitério será gestado por uma Fraternidade Fonte, composta de dez membros que residirão, se possível a todos, no espaço do eremitério. E essa fraternidade se reunirá uma vez por mês em um sábado para que, de manhã possam realizar um estudo sobre uma temática escolhida e trazida por um dos membros da fraternidade e que apresentará como estudo para todos. E após o almoço que se faça a revisão de vida, apresentando cada um, com sinceridade de coração, como vivenciou o último mês, suas alegrias e tristezas e os acertos de vida que necessitam ser feitos.
78. Se o Senhor, em sua vontade, desígnio e amor enviar novos membros que desejarem seguir e viver este estilo de vida, que os mesmos sejam acompanhados pela fraternidade fonte por um ano, com visitas de final de semana ao eremitério e participando de sua vida. E após um ano, se a vontade de ingressar nessa vida persistir que possam ser admitidos para uma experiência de vida de mais um ano, agora junto com outro ou outra que também foi acompanhado, convivendo juntos nas ermidas da provação. Durante esse período que possam participar dos encontros da Fraternidade Fonte que ao final de todo esse processo, com amor, transparência e verdade, juntamente com o irmão ou irmã provado, avaliará a caminhada de dois anos e juntos decidirão o ingresso na vida do eremitério de uma maneira mais permanente, até quando lhes inspirar o Senhor.
79. Havendo um número de eremitas superior a 14 irmãos e irmãs, que se busque fundar outro eremitério em lugar, cidade ou país que o Senhor indicar.
80. “Mas eu vos digo, a vós que me escutais: Amai os inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam, falai bem dos que vos maldizem e orai por quem vos calunia” (Lc 6, 27 – 28). Nosso Senhor Jesus Cristo está sempre perdoando. Tem sempre o coração livre de rancores, raiva e ódio. “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (Lc 23, 34). O filho e filha de Deus, a semelhança de Jesus, deve sempre esvaziar imediatamente o coração dos sentimentos negativos com a oração e intercessão, por aqueles que não mereceriam isso. Deve buscar sempre o diálogo e o esclarecimento da situação.
81. Procura não ter expectativas em relação ao outro. Se ele acertar, ótimo. Se errar, não tem problema. É um ser humano em aprendizado, assim como eu. Se me feriu, se me ofendeu, poderia ter sido eu também o ofensor, o que precisaria do perdão.
82. Evitar totalmente os julgamentos antecipados. Espera ouvir, conhecer melhor, conviver mais. “Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não series condenados; absorvei e sereis absorvidos. Dai e vos será dado: uma medida boa, apertada, sacudida, transbordante vos será colocada em seu colo. Pois a medida com que medirdes, será usada para medir-vos” (Lc 6, 37 – 38).
83. O amor é um sentimento prático, vem quando queremos. Sentimos quando nos dispomos a sentir. Vem de Deus, não é nosso. E Ele envia o amor quando nos abrimos para recebê-lo. Podemos sim amar a tudo e a todos, independente de quem sejam. Basta termos a disposição de amar. “Assim sereis filhos do Altíssimo porque Ele é bondoso para com ingratos e maus. Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso” (Lc 6, 35 – 36).
84. “Por que comeis e bebeis com cobradores de impostos e pecadores? Respondendo Jesus lhes disse: ‘Não têm necessidade de médico os sãos mas, sim, os enfermos. Não vim chamar os justos para a conversão, mas os pecadores” (Lc 5, 30 – 32). O filho e filha de Deus, a exemplo de Jesus Cristo, procura, visita, está entre os pecadores e os de má fama. Pois eles são os preferidos de Deus. Não olha para suas condutas, mas eles enquanto pessoas, filhos e filhas de Deus necessitados do amor e ternura de Deus. Assim, tratando-os com carinho, ternura, amor e reverência fazem-nos sentir a Presença de Deus que sempre esteve ali, mas que ter nossa mediação. Com nossa oração, amor e cuidado podemos levar muitos caídos da vida, ao encontro com o Senhor e assim à mudança de vida. Se assim no tempo de cada um, acontecer. “Espera, pois, no Senhor” (Sl 27, 14).
85. “É preciso que também anuncie a boa-nova do Reino de Deus às outras cidades, porque para isto é que fui enviado’. E ia pregando pelas sinagogas da Judéia” (Lc 4, 43 – 44). O filho e a filha de Deus tem o coração itinerante. Está sempre a caminho. Está sempre pronto para partir para onde o Senhor lhe inspirar e enviar. Não tem nenhum lugar nesse mundo como seu lugar, pois sua pátria definitiva, seu ponto de chegada é o céu.
86. A itinerância que começa com Abraão, com o chamado de “Sai da tua terra e vai” (Gn 12, 1 – 9). Que passa por Jacó e seus filhos levando-os para o Egito. Que retorna com Moisés e o Povo de Deus através do Êxodo. Que se atualiza de maneira definitiva no Verbo de Deus que desce e se encarna na humanidade e que faz sua mãe sair de casa para servir a Isabel. Que põem José e Maria em viagem para nascer em Belém. Que põe a caminho os anjos que descem do céu para anunciar a Boa Nova, o que faz por sua vez os pastores saírem de seus campos para visita-lo pela primeira vez. Que faz uma estrela se por a caminho no céu conduzindo os magos com seus presentes na direção do Menino. Que faz José e Maria se porem a caminho para o Egito para salvar sua vida. Que nasce para ser o Pão do caminho. Pão que me leva a seguir. Porque Nosso Deus quando se mostra não chama para que se mantenham as estruturas. O seu chamado é para sairmos das estruturas de uma vida igual e cômoda.
87. “Embora sobrenatural, a fé como experiência humana é a capacidade de dom e de risco em relação ativa com o próprio futuro e a própria segurança, é a disponibilidade diante do novo” (A. Dalbesio). O Povo de Deus no deserto demonstraram não ter fé quando voltaram a pensar nas cebolas do Egito, numa vida de escravidão, mas de segurança, enquanto diante deles se descortinava um futuro completamente incerto que só tinham a seu favor a promessa de Deus. Os primeiro cristãos “judeus” demonstraram falta de fé quando voltaram a pensar na segurança da religião dos pais, o Judaísmo, estruturado e seguro, enquanto que diante deles só lhes eram oferecidas a palavra e a vida de Jesus Cristo, pessoa controvertida, amado por uns, odiado por outros, e politicamente completamente fracassado. Nós temos a tentação sempre de termos a tranquilidade e segurança. Ter fé é um exercício contínuo de confiar em Deus plenamente, mesmo contra todas as probabilidades.
88. O filho e a filha de Deus, estando sempre na escuta do Senhor, deve estar sempre pronto para seguir. Se possível, não possuir bem móvel ou imóvel algum e poucas roupas e pertences, e nenhuma reserva econômica, para que viva plenamente a segurança no Senhor da vida. O único que provê todo o necessário àqueles que a Ele se entregam sem reservas e com total confiança. “Não temais, ó pequenino rebanho; porque vosso Pai se agradou em dar-vos o seu reino. Vendei os vossos bens e dai esmola; fazei para vós outros bolsas que não desgastem, tesouro inextinguível nos céus, onde não chega o ladrão, nem a traça consome, porque, onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.” (Lc 12, 22 – 34). “Não se vendem cinco pardais por apenas alguns trocados? E todavia nenhum deles é esquecido por Deus. Até mesmo os cabelos da cabeça estão todos contados. Não tenhais medo, que valeis mais que muitos pardais.” (Lc 12, 6 – 7). Se tivermos a coragem da mudança Deus estará conosco e mostrará sempre a sua vontade e será a nossa segurança. Maria e José foram peregrinos na fé. Os caminhos não estavam claros para eles, mas procuravam reconhecer a vontade de Deus nos acontecimentos. “Sai e vai para um lugar que eu te mostrarei!” (Gn 12, 1 – 9).
89. “Qual de vós, por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida? Se, portanto, nada podeis fazer quanto às coisas mínimas, por que andais ansiosos pelas outras?” (Lc 12, 25 – 26). O nosso coração deve estar inteiramente em Deus, Senhor e guarda de nossa vida. Todo o bem que nos vem, também tudo o que, aos nossos olhos, parecer não ser o bem; nada nos acontece sem que seja de sua Santíssima Vontade. Tudo é autorizado por Ele. Só Ele tem a capacidade de transformar o que, aos nossos olhos, não é bom, em aprendizado e graça.
90. Ser Filho de Deus é caminhar arraigado na fé e na confiança total em Deus, mesmo desprovido de pátria, lar, segurança e garantida de subsistência. Algo que quase sempre acontece em nossas vidas: Nós queremos algo de Deus, Deus nos promete, nós confiamos em Deus, mas sempre queremos nós mesmos tomar as providências. Queremos fazer de nosso jeito, não esperamos a ação de Deus, na verdade confiamos mais em nós mesmos que em Deus. Abraão tinha a promessa, mas Sarai, mulher de Abraão não tinha filhos, então ele mesmo deu um jeito. Abraão não esperou no Senhor. Tentou ele mesmo resolver o seu problema. Abraão recebe a escrava de Sarai, Agar, como mulher e ela concebe um filho de Abraão. Abraão tem como filho de Agar, Ismael. E desde que o menino é gerado, Abraão encontra problemas. Porque ele é filho de uma escrava. Quando nós buscamos resolver nossos problemas e fazer nossos empreendimentos por nossa própria conta, sem esperar no Senhor. Transformamos nossos problemas e empreendimentos em filhos da escravidão. Pode ser que cada vez mais complique a situação. Ou não dê certo como deveria. Tudo tem que ser entregue antes de tudo nas mãos do Senhor. Seremos apenas instrumentos dEle. Mas Ele que deve a tudo conduzir. Ele é Todo-poderoso, sabe tudo, conhece a tudo e quer sempre o melhor para nós.
91. “Enquanto falavam apresentou-se Jesus no meio deles e lhes disse: “A paz esteja com vocês!” (Lc 24, 36). A paz é o melhor dom que podemos levar a alguém, mas para leva-la é preciso que a possuamos e só podemos possuí-la se convivemos em todos os momentos com a fonte da Paz, a Santíssima Trindade de Deus. Estar em paz, quer dizer estar em casa. Estar reconciliado consigo mesmo. E só Deus realiza isso, a reconciliação com o nosso próprio ser e com os outros. Nosso Senhor Jesus Cristo assim que ressuscita, o primeiro legado que dá aos discípulos, temerosos por tudo o que tinha acontecido, é a paz. Pois com a paz tudo o mais suportamos. Desta forma, o filho e a filha de Deus, batizados em Cristo Jesus devem ser portadores da Paz do Divino Mestre. E assim, que possamos nos saudar diariamente: “A paz esteja contigo!”. Ao que o outro poderá responder: “E contigo também!”. Ou ainda com a “Shalom!”, que é a paz no sentido hebraico, a paz sem dívida alguma. Desejar ao outro que em sua vida ele esteja sempre na paz com tudo e com todos, no perdão de tudo e todos. “Shalom!”.
92. De outro modo, o Senhor ao despedir-se dos apóstolos subindo aos céus os abençoou. “Levou-os em seguida até perto de Betânia, elevou as mãos e os abençoou. Enquanto os abençoava, separou-se deles e foi elevado aos céus” (Lc 24, 50 – 51). Além do dom da paz que podemos dar aos irmãos e irmãs quando com eles nos encontramos, podemos deixa-los com o dom da benção. Dizendo simplesmente: “Deus te abençoe!”.
93. Entre o plano da traição de Judas e a predição da negação de Pedro, o evangelista Mateus relata a instituição da Eucaristia. Judas sai para traí-lo (Mt 26, 14 – 16), e mesmo assim acontece a Última Ceia, que é a antecipação da entrega na Cruz, por puro amor. Passividade total de um Deus que é todo-poderoso que se deixa aniquilar como um cordeiro imolado para provar que ama. Para tirar de nossos ombros as consequências de nossos pecados. E dar o céu, gratuitamente a nós. Que nunca seremos merecedores do mesmo. Depois da ceia a fuga dos apóstolos e a negação de Pedro (Mt 26, 30 – 35). Não merecíamos a Eucaristia. E em Lucas “O Senhor voltou-se e olhou diretamente para Pedro” (Lc 22, 61). Após a traição de Pedro, Cristo olha para Pedro, e Lucas usa o mesmo verbo “olhar” que tinha usado uma única vez em todo o seu evangelho lá no início quando chama Pedro. Ou seja, apesar da negação, Jesus Cristo continua amando Pedro como antes. Seu amor não mudou. Não se decepcionou. Não guardou rancor nenhum. O seu amor é o mesmo. E é isso que faz Pedro chorar amargamente. (Lc 22, 62). Os evangelistas destacam a incomparável gratuidade de Jesus, que supera a traição, a negação e a fuga dos amigos. O amor dEle não depende daquilo que os outros fazem a Ele.
94. E é na Cruz, “fraqueza e loucura aos olhos do mundo, porém, sabedoria e poder de Deus para a nossa salvação” (I Cor 1, 18 – 25), que se conhece a manifestação do “Eu-Sou”. A Cruz dá a verdadeira imagem de Deus: amor incondicional, maior que qualquer violência, inabalável diante da violência, maior que a própria morte. A Cruz testemunha o imenso e eterno amor que flui do coração do Pai. É fonte onde o coração humano sacia a sede de amor, de fraternidade, de justiça e de misericórdia.
95. Jesus convida a todos ao amor generoso e universal. Ao exercício permanente de estar no amor que é paciente, bom, não sente inveja, não dar asas à vaidade, não se deixa trair pela soberba; não faz nada de inconveniente, não age por interesse, não se deixa seduzir pela cólera, e não guarda nenhum rancor; não sente prazer nenhum com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Suporta tudo, acredita em tudo, espera o tempo que for preciso, e desculpa tudo. (I Cor 13, 4 – 7). O filho e filha de Deus que se abre e busca viver a todo momento esse exercício tornar-se-á aos poucos em sua vida semelhante a Ele. “Por que Deus é amor” (I Jo 4, 8).